Armando Baptista-Bastos

Precursor de um estilo jornalístico inovador, controverso e polémico, Baptista-Bastos foi um dos maiores jornalistas e escritores da sua época. 

Onde é que você estava no 25 de abril?

Era esta a pergunta que colocava aos seus convidados no programa Conversas Secretas, na SIC (1996-1998) e, sobretudo, numa série de 16 entrevistas realizadas para o jornal Público, em 1999. Esta pergunta, associada à sua voz inconfundível, deixou marcas na sociedade portuguesa e ainda hoje é assim lembrado. 

Armando Baptista-Bastos é, acima de tudo, um grande comunicador, dotado de grande capacidade de utilização da palavra e com forte sentido de intervenção social. A sua vida foi dedicada ao jornalismo e à escrita. Dedicou 23 anos da sua carreira ao Diário Popular, mas teve oportunidade de trabalhar e escrever para inúmeros órgãos de comunicação. A crónica foi a sua arma, escrita num estilo próprio, inovador e também polémico.

 

A formação de um jornalista

Nasceu em 1934, a 27 de fevereiro, no Bairro da Ajuda em Lisboa, filho do tipógrafo-chefe do jornal O Século, que lhe incutiu o gosto pela escrita e pelo jornalismo. 

A escrita entra cedo na sua vida. Aos 14 anos, escreve para a secção infantil de O Diário Popular, enunciando já a sua preocupação com a crítica social. Aos 19 anos, entra para a grande referência do jornalismo nacional, O Século, sob a égide de Acúrcio Pereira. Será pelas mãos deste chefe de redação que Baptista-Bastos tem a possibilidade de trabalhar em todas as secções deste jornal, adquirindo vasta experiência. 

Foi subchefe de redação de O Século Ilustrado. É aqui que inicia um estilo inovador e algo polémico, com a sua coluna de crítica e de comentário de cinema. 
 

Armando Baptista-Bastos

A “Revolta da Sé”

Em 1959, fez parte da conspiração contra o Regime de Salazar, que decorreu na Sé Patriarcal de Lisboa. A participação nesse frustrado golpe da “Revolta da Sé” colocou-o sob o olhar atento da PIDE e valeu-lhe não só o despedimento do jornal “O Século”, mas também a clandestinidade.

Foi nesse período da sua vida que conheceu Fernando Lopes, passando a colaborar com o cineasta em diversos projetos, incluindo a realização dos diálogos para o filme sobre o antigo campeão de boxe - Belarmino, um dos clássicos do Cinema Novo português.

É na semiclandestinidade que escreve O secreto Adeus, o seu primeiro livro de ficção, que é na realidade uma crítica ao jornalismo português da época. É ainda nestas circunstâncias que recorre à utilização de pseudónimos para trabalhar para a RTP, escrevendo textos para noticiários e documentários de Fernando Lopes e do também cineasta Baptista Rosa. Passados poucos meses, e mesmo sob o nome de Manuel Trindade, o secretário nacional de informação despede Baptista-Bastos por o considerar um “adversário do Regime”.

Após o despedimento da RTP, colaborou com a Agence France Press e com o jornal República, mas rapidamente foi convidado pelo ator Raúl Solnado para trabalhar como seu secretário na TV Rio, no Brasil. Quando chega ao Brasil está a decorrer o golpe de Estado que conduz à deposição do então Presidente Goulart e que leva ao início da ditadura militar brasileira. Baptista-Bastos faz a cobertura dos acontecimentos e envia a informação para o jornal da República. A Censura impede a publicação das notícias.

 Armando Baptista-Bastos

 

O jornalista de “estilo inconfundível”

Quando volta para Lisboa é convidado para integrar a redação do jornal O Diário Popular, no qual, nos 23 anos seguintes, tem oportunidade de desempenhar importantes funções.

Vai assinar reportagens, entrevistas e crónicas, sobre variadíssimos temas, destacando a realidade portuguesa da época, mas também a de muitos outros países, sempre com o seu “estilo inconfundível”, nas palavras de Adelino Gomes, seu amigo.

Esta sua vasta experiência enquanto jornalista traduziu-se, também, na sua obra As Palavras dos Outros, publicação que se torna numa referência na profissão e recomendada no I Curso de Jornalismo organizado pelo Sindicato dos Jornalistas. Baptista-Bastos era, a um tempo, crítico social e crítico da própria profissão: “Eu não troco os valores essenciais do jornalismo pelos falsos valores que hoje impõem aos jovens jornalistas”. 

Fernando Dacosta considera-o “uma referência obrigatória na profissão”.

Armando Baptista-Bastos

A sua marca nos meios de comunicação

No pós-25 de abril de 1974, Baptista-Bastos inicia uma nova fase na sua carreira que coincide com a sua saída de O Diário Popular. Numa fase inicial mais precária, trabalha para o Jornal Europeu e, de seguida, para O Diário. Faz ainda traduções e escreve para empresários e políticos.

Ao longo dos anos seguintes trabalha para vários jornais e desenvolve paralelamente a sua carreira como escritor. Contribuiu para o Almanaque, a Seara Nova, a Gazeta Musical e de Todas as Artes, a Época, o Sábado, o Jornal de Notícias, A Bola, o Tempo Livre, o Jornal de Letras, Artes e Ideias, o Expresso, o Jornal do Fundão e o Correio do Minho. Estabeleceu-se sobretudo como cronista e como crítico. 

Um marco na sua carreira foi a fundação do semanário O Ponto nos anos 80, e estava entre os seus fundadores. Neste jornal, publicou um conjunto importante de 82 entrevistas, inovadoras e marcantes, que foram compiladas na obra “O Homem em Ponto” (1984). 

Foi também presença assídua na rádio e na televisão. Lia as suas crónicas na rádio, na Antena 1 e na Rádio Comercial. Foi também o primeiro comentador das “Crónicas de Escárnio e Maldizer” da TSF.

É com o convite de Emídio Rangel que apresenta o programa “Conversas Secretas” na SIC entre 1996 e 1998. Em 2001 passa para a SIC Notícias, onde apresenta um programa de entrevistas “Cara-a-Cara”. Da sua colaboração enquanto cronista do Público, surge o convite para organizar uma série de entrevistas, com a pergunta de Baptista-Bastos que o trouxe para a esfera mediática: “Onde é que você estava no 25 de abril?”, publicadas posteriormente em CD-ROM.

Foi também pelas mãos de Herman José, que a frase icónica de Baptista-Bastos ficou imortalizada. As suas entrevistas em “Conversas Secretas” foram parodiadas pelo humorista, imitando-lhe a voz gutural, a que Baptista-Bastos reagiu com bom sentido de humor.

A 9 de maio de 2017, Baptista-Bastos morre com 83 anos, deixando um reconhecido legado como escritor e jornalista.

Enquanto escritor deixou-nos crónicas, reportagens, ensaios cinematográficos, entrevistas e romances. As suas obras literárias valeram-lhe vários prémios, distinções e homenagens, desde o Prémio Feira do Livro (1966) ao Prémio Alberto Pimentel do Clube Literário do Porto (2006).

O seu trabalho como jornalista também mereceu distinções, entre as quais se contam o Prémio O Melhor Jornalista do Ano (1980 e 1983) ou o Prémio Nacional de Reportagem/Prémio Gazeta (1985). 

O destaque no Panteão dos Imortais é a homenagem que o NewsMuseum presta a Baptista-Bastos: o jornalista, o escritor, o homem.