Tolentino de Nóbrega
Tolentino de Nóbrega estreia-se no Jornalismo dos anos 70, consolidando a sua carreira no Público. Inconformado, enfrenta o poder regional e luta pela profissão e pela liberdade de expressão e informação.
A 7 de abril de 2015, o Público escrevia na sua edição online: «Morreu Tolentino de Nóbrega, jornalista sem medo».
Tolentino de Nóbrega, jornalista madeirense, ficaria eternamente conhecido como o jornalista que fez frente ao governo de Alberto João Jardim, apesar das tentativas de silenciar o repórter.
Contra tudo e todos, Tolentino de Nóbrega persistiu e manteve a sua coragem em nome de um jornalismo livre e independente.
Os primeiros passos
José Tolentino Oliveira Nóbrega nasceu no Machico, na Madeira, a 2 de fevereiro de 1952.
Iniciou a sua carreira jornalística como colaborador do Comércio do Funchal, em 1972. O semanário, impresso em papel cor de rosa, distinguiu-se como o melhor jornal da oposição ao regime salazarista na Madeira.
Entre 1974 e 1993 integrou a redação do Diário de Notícias do Funchal (sendo editor e coordenador de secções como Educação e Cultura).
Passou por vários periódicos como o Expresso e os desaparecidos A Lutae O Jornal, mas foi no jornal Público, aquando da sua fundação, que consolidou a sua carreira.
Licenciado na Escola Superior de Artes Plásticas da Madeira, Tolentino de Nóbrega, a par da sua atividade jornalística, ainda se dedicava às artes.
Além disto, o jornalista ainda tinha tempo para dar aulas de geometria descritiva na Escola Secundária Francisco Franco.
A luta pela liberdade
Mais tarde, em 1989, passou para os quadros do jornal Público como correspondente da Madeira.
Seria aqui que Tolentino de Nóbrega enfrentaria as discriminações, ameaças e perseguições do governo de Alberto João Jardim.
Estes seriam tempos conturbados. As tentativas de domesticar, amedrontar e silenciar o jornalista não se fizeram tardar.
Enfrentando um poder quase unipessoal do dirigente da Madeira, Tolentino viu-se alvo de vários atentados terroristas de uma autoproclamada Frente de Libertação da Madeira (FLAMA)… e não só.
O Jornal da Madeira, mantido por Alberto João Jardim, referia-se sempre a Tolentino como «tôlo entino» nos seus cartoons, além de o associar a um agente do «colonialismo» continental que trabalhava para o «pasquim do capitalista Belmiro».
Apesar de muitos madeirenses discordarem do dirigente do PSD, estas referências no Jornal da Madeira afetavam, de algum modo, a opinião pública madeirense, que chegou a condenar e censurar o jornalista.
Por seu turno, Tolentino retaliava através de uma dedicada e constante militância no Sindicato dos Jornalistas, tendo sido secretário suplente da Mesa da Assembleia-Geral (1983/84 e 85/86), vice-presidente da Assembleia Geral (1996/97) e membro do Conselho Geral (2002/12).
Embora Tolentino de Nóbrega incomodasse o poder regional com as suas críticas ao governo de Alberto João Jardim, o jornalista recebeu várias distinções pelo seu rigor e profissionalismo.
Em 1999, conquistou o Prémio Gazeta, o maior galardão do jornalismo português e em 2006 foi condecorado pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, com a Ordem do Infante D. Henrique no grau de Comendador.
«Não sou crítico do dr. Alberto João Jardim, sou crítico de todas as formas de autoritarismo e de todas as formas de governo que desrespeitem as liberdades, muito particularmente a liberdade de expressão. Sem uma imprensa livre não há democracia. Se há, numa região de Portugal, pressões e coações contra jornalistas, restrições ao acesso às fontes de informação, não há democracia plena, há défice democrático. Ele tem a legitimidade de um governante eleito, mas o Hitler também foi eleito...», afirmou o repórter ao jornal Record, aquando da receção do Prémio Gazeta.
Um jornalista sem medo
Tolentino de Nóbrega seria considerado, para muitos colegas de profissão, um verdadeiro herói do jornalismo, que enfrentou grandes desafios contra a sua liberdade de expressão num período pós-25 de Abril em que tal condicionante era impensável.
«Portugal perdeu esta terça-feira um dos seus melhores jornalistas. Aquele que, depois do 25 de Abril de 1974, mais teve de se bater, no dia a dia, com as armas da profissão, pelo direito e pela liberdade de imprensa e de informação. O país político e a opinião pública têm uma dívida para com Tolentino de Nóbrega. Justo seria que o Presidente da República o condecorasse, no próximo 10 de junho, com a Ordem da Liberdade».
José Pedro Castanheira
«Tolentino de Nóbrega soube ser, sem sombra para dúvidas, um intransigente e suave defensor da liberdade de expressão numa época e região do nosso país onde era muito difícil sê-lo».
Francisco Teixeira da Mota