1975

27/04/1975

O VERÃO MAIS QUENTE

1975 foi o ano de maior efervescência político-militar da nossa história democrática. Os dois pontos-chave do ano foram a 11 de março e a 25 de novembro. Na primeira data, movimentações políticas e militares da direita tentaram um golpe de Estado. Um dos implicados, o general Spínola, fugiu de helicóptero para Espanha, onde seria criado no outono um Exército de Libertação de Portugal, braço armado de um Movimento Democrático para a Libertação de Portugal.

Em resposta ao 11 de março, os militares davam uma forte guinada à esquerda do poder político, que detinham. Foi o tempo das nacionalizações e do “poder popular”, clima em que decorreram as primeiras eleições livres, a 25 de Abril, para a eleição da Assembleia Constituinte, com este pormenor: para evitar “manipulações” dos votos em branco, a Comissão Nacional de Eleições aceitava que quem o desejasse traçasse um risco sobre o boletim.

Durante o “verão quente”, ou PREC (Processo Revolucionário em Curso), como ficou conhecido o período revolucionário entre o 11 de março e o 25 de novembro, sucederam-se negociações e braços de ferro entre os partidos políticos e o Movimento das Forças Armadas, onde as três principais figuras, os esquerdistas Costa Gomes, Vasco Gonçalves e Otelo Saraiva de Carvalho, tinham tomado “a direção da revolução”, como titulava o Expresso. Havia manifestações sob os mais variados pretextos, como o protesto contra a execução de cinco antifascistas espanhóis, que desembocaria no incêndio da embaixada e do consulado de Espanha. O próprio Parlamento acabaria cercado por operários da construção civil, que sequestraram os deputados durante muitas horas.

Antes, no verão, tinha surgido o famoso “Documento dos Nove”, no qual nove influentes militares participantes no 25 de Abril traçavam os princípios de uma recentragem.

A atualidade política era tão fértil e tão célere que o Expresso passou a ter a partir de 5 de novembro edições extra às quartas-feiras, que duraram até à primeira semana de janeiro seguinte.

O “verão quente” terminaria a 25 de novembro, com as operações militares chefiadas por um não muito conhecido coronel Ramalho Eanes. A maré esquerdista foi contida e começou a normalização política e institucional. Em Espanha começava também a normalização democrática, com a morte do ditador Francisco Franco e a proclamação de Juan Carlos como Rei.

O Governo ultimava entretanto um grande plano de austeridade, que previa, nomeadamente, limitações às vendas a prestações, num ano em que por exemplo o preço do açúcar já tinha aumentado praticamente para o dobro.

Quem quisesse entrar para a Universidade tinha de cumprir um ano de serviço cívico obrigatório, uma nova Concordata entre Portugal e a Santa Sé passou a aceitar o divórcio nos católicos e foi assinado o despacho para a construção de mais um “sublanço da autoestrada do Norte”, entre Vila Franca de Xira e o Carregado.

No meio do caos político, social e militar, Portugal acabava o ano tendo cumprido uma façanha: uma ponta aérea tinha trazido das ex-colónias, sobretudo de Angola, mais de 600 mil pessoas. Colónias que neste ano se tornaram países independentes, com exceção de Timor, invadido pela Indonésia.

 

 

Expresso 1975