1988
FOGO NO CHIADO
Um incêndio que devastou o coração de Lisboa e o lançamento de duas das mais marcantes obras nacionais foram dois dos grandes acontecimentos do ano em que o Expresso festejava os seus 15 anos de existência.
As obras ainda teriam de esperar, mas foi logo no início de 1988 que foi lançado o concurso para a construção do Centro Cultural de Belém e que o Governo se reuniu para debater o início da construção da Barragem de Alqueva.
Na mesma altura, fevereiro, começava a emitir, de forma experimental, a primeira rádio local — era a abertura da comunicação social, que passaria pela privatização de todos os jornais do Estado, em maio, e pela autorização das rádios locais, que surgiram às centenas.
Quatro vilas passaram a cidade: Vila Real de Santo António, Marinha Grande, Montemor-o-Novo e Fundão, foram descobertos novos heterónimos de Fernando Pessoa e, já nessa altura, um grande texto na revista do Expresso alertava para as alterações climáticas, que — dizia-se nele — iam acabar com as estações do ano. Na RTP era suspenso o programa “Humor de Perdição”, de Herman José, e no Parlamento era aprovada a lei do nudismo.
Na política doméstica, foi estabelecida uma nova tabela para os salários dos políticos e um dos assuntos de que mais se falou durante semanas foi a (não) renovação do Partido Comunista Português (PCP). A “dissidente” Zita Seabra foi afastada do Comité Central do PCP e outros partidários do amaciamento da ortodoxia do partido — que ficaram conhecidos como “grupo dos seis” — enviaram ao secretário-geral de então, Álvaro Cunhal, um documento com críticas ao modo como o partido tinha respondido às suas propostas de renovação. O próprio escritor José Saramago interveio nesse debate.
No fim de agosto abatia-se sobre Lisboa a comoção e a consternação: a zona-ícone da cidade, o Chiado, ardia. Deflagrado às cinco horas da manhã, nos Armazéns Grandella, destruiu 18 edifícios, numa área equivalente a cerca de oito campos de futebol.
O ano seria ainda marcado por duas mortes violentas. No que constituiu o primeiro crime mortal por ódio político, o militante revolucionário e antirracista José Carvalho foi morto à facada por um grupo de skinheads, no dia 28 de outubro, à frente da sede da formação de extrema-esquerda Partido Socialista Revolucionário.
A outra morte tinha sido a execução do fundador do movimento oposicionista moçambicano Renamo, Evo Fernandes, por dois operacionais a trabalhar para os serviços secretos de Moçambique, que o mataram numa estrada de Malveira da Serra depois de terem jantado com ele no Guincho. No ano seguinte surgiram notícias de que a embaixada de Moçambique teria pago mil contos (cinco mil euros) pelo serviço.
A nível internacional, também com móbil político, o atentado (de agentes líbios, soube-se mais tarde) contra um avião norte-americano, que explodiu quando sobrevoava a localidade escocesa de Lockerbie, matando os 259 ocupantes.
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