1990
(DES)ACORDO ORTOGRÁFICO
No ano em que o Expresso publicou a sua maior edição de sempre — pesava 1,8 kg —, uma das primeiras páginas que ficou famosa foi a de 18 de agosto. Não tanto pela manchete, sobre o caso do então governador de Macau, Carlos Melancia, que vinha a público desmentir ter recebido “luvas” de uma empresa alemã, mas mais por causa de uma foto do chefe do Governo, o reservado e formal Cavaco Silva, fotografado a subir em fato de banho a um coqueiro em São Tomé. “Foram oito dias de sonho que nunca mais vou esquecer”, disse ao Expresso.
Em 1990 chegou a ser discutida a proibição de circulação de automóveis ligeiros durante o fim de semana e o racionamento de combustível a particulares, para prevenir eventuais falhas de abastecimento provocadas pela guerra no Médio Oriente, onde o Iraque invadira o Koweit. A Sonae, de Belmiro de Azevedo, dava que falar, quer por causa de divergências relacionadas com a construção do futuro centro comercial Colombo quer pelo “aliciamento” de pilotos da Força Aérea, já que a Sonae anunciava ir lançar-se no sector da aviação comercial, depois de também ter manifestado interesse na banca
O ano não foi bom para as secretas portuguesas, porque quando um serviço secreto aparece nas notícias... Foi o que aconteceu aquando da visita a Portugal do líder da UNITA, Jonas Savimbi, durante a qual houve incidentes entre dois serviços, que andavam a fotografar-se um ao outro. Tempos antes já fora noticiado que as futuras instalações do Serviço de Informação e Segurança tinham sido assaltadas, por ladrões que levaram “diverso material de escritório”.
Na política nacional, em fevereiro as FP-25 renunciaram à luta armada e o líder dos centristas, Freitas do Amaral, foi premonitório, ao dizer não augurar “nada de bom para o futuro do CDS”. Outra notícia de monta seria, no fim de outubro, a de que Álvaro Cunhal ia abandonar o cargo de secretário-geral do Partido Comunista Português — embora isso já se antevisse há várias semanas, depois de Carlos Carvalhas ter sido escolhido para nº 2 do partido.
Em 1990 mudou a forma como milhões de pessoas — incluindo o autor destas linhas — escreviam português, ao ser assinado o novo acordo ortográfico, e do estrangeiro chegaria uma notícia algo surpreendente sobre um país europeu no fim do século XX: a de que forças políticas do Governo da Bélgica aceitavam acabar com a pena de morte.
Marcado já pelo signo das presidenciais de janeiro seguinte, o ano terminaria com a decisão da Ordem dos Médicos de expulsar o controverso clínico espanhol José Maria Tallon, o “mago das curas de emagrecimento” (“Foste ao Tallon?”, perguntava-se invariavelmente a quem aparecia de repente com uns quilos a menos).
Entretanto, tinha sido aberta a quinta faixa da Ponte 25 de Abril, os números de telefone tinham passado de seis para sete algarismos e aparecera um novo jornal diário, chamado “Público”.
Iniciado com a libertação do mais famoso preso político, Nelson Mandela, que marcaria o princípio do fim do regime de apartheid na África do Sul, o ano terminaria com o chanceler da República Federal Alemã a decretar solenemente a reunificação das duas alemanhas.
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