1989
SECOS E MOLHADOS E QUEDA DO MURO
Este foi o ano em que se diz que acabou o século XX, por ter começado a cair, um após outro, como um dominó, todo o chamado Bloco de Leste — a União Soviética e todos os seus aliados. O maior símbolo da divisão da Europa, o Muro de Berlim, era derrubado no fim de outubro, e antes do fim do ano caíam os regimes comunistas da Checoslováquia e da Roménia, cujo líder, Nicolae Ceausescu, seria fuzilado no dia de Natal, juntamente com a mulher.
No âmbito internacional houve ainda outro grande acontecimento: a chacina da praça Tiananmen, em Pequim, onde o movimento pró-democracia, que aí se manifestava diariamente há semanas, foi esmagado pelos tanques o Exército, fazendo muitas dezenas de mortos, não se sabe quantos. No Irão foi sepultado o líder da revolução islâmica, ayatollah Khomeini, e decretada uma “fatwa” (decreto religioso) condenando à morte o escritor Salman Rushdie, por causa do livro “Versículos Satânicos”.
No mesmo mês, outro acontecimento internacional, com grande significado para Portugal, foi o cessar-fogo na guerra civil em Angola. Foi também neste ano que a avioneta que levava João Soares para a África do Sul depois ter ido visitar Jonas Savimbi à Jamba caiu ao levantar, deixando Soares entre a vida e a morte. No avião também seguiam os deputados Nogueira de Brito, do CDS, e Gomes da Silva, do PSD. Nos Açores registou-se um acidente de aviação bem mais trágico: um Boeing 707 com 145 pessoas que iam de Itália para a República Dominicana, embateu no Pico Alto, na ilha de Santa Maria, quando se preparava para uma escala de reabastecimento.
A nível nacional, o destaque do ano foi o episódio que ficaria conhecido como “os secos e molhados”, a repressão no Terreiro do Paço de uma manifestação de polícias que reivindicavam direitos sindicais, dispersados com canhões de água por outros polícias.
No fim do verão surgia um caso que abalaria durante semanas a sociedade lisboeta e não só: a revelação de vídeos sexuais do arquiteto Tomás Taveira, que “obrigaria” o primeiro- ministro, Cavaco Silva, a fazer em novembro (após a publicação de imagens na revista espanhola “Interviu”) uma comunicação ao país para denunciar uma “campanha” para “denegrir o bom nome” das pessoas visadas (corria o boato de que estaria envolvida a mulher de um ministro).
Na política, 1989 foi o ano da aliança histórica entre PS e PCP para a corrida às eleições autárquicas em Lisboa, nas quais o socialista Jorge Sampaio venceu o social-democrata Marcelo Rebelo de Sousa.
Já neste ano se falava também de um tema que hoje continua atual, o da exclusividade dos médicos do Serviço Nacional de Saúde, com a ministra da Saúde de então, Leonor Beleza, a fazer uma proposta de aumentos que podiam chegar aos 110%. Ainda nesta área, o Sindicato Independente dos Médicos aceitava os genéricos.
No Expresso — que na edição de 26 de agosto publicou na primeira página uma foto que hoje talvez não fosse possível, uma padiola com as cabeças de dois membros da resistência timorense decapitados por militares indonésios — 1989 foi o ano da “refundação”.
Na edição de 1 de abril era anunciada a saída de dois membros da direção e de vários jornalistas, para fundarem um novo diário. Não era mentira. No ano seguinte nascia o “Público”. E, em outubro, o Expresso anunciava novidades, com a autonomização das secções de Internacional e de Desporto, que passaram a ter cadernos próprios, e a “experiência de introdução da cor nos cadernos de grande formato”.
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